AME E DÊ VEXAME...
Gil Salomon
escritor
gilsalomon2000@yahoo.com.br
O título acima não é meu. Trata-se do título de um dos livros de Roberto Freire, escritor, dramaturgo, cineasta, roteirista de TV, jornalista, psiquiatra, terapeuta e, um “militante do tesão”, como se definia. Freire nasceu em São Paulo em 1927 e encerrou sua militância pela anarquia e pela liberdade em 2008. Tenho em mãos o livro “Ame e Dê Vexame” e ao lê-lo percebo a importância das reflexões do autor sobre um tema sempre atual: o amor. Ele trata das dificuldades de sua concretização na vida dos jovens, principalmente, submetidos a repressões familiares e sociais típicas de sociedades burguesas e autoritárias. Ele trata com humor e jovialidade todas as formas possíveis de superação dos obstáculos que dificultam o amor humano: “Porque eu te amo, tu não precisas de mim. Porque tu me amas, eu não preciso de ti. No amor, jamais nos deixamos completar. Somos, um para o outro, deliciosamente desnecessários”.
Freire revela como o medo do ridículo é imposto, pelo autoritarismo social, sobre os jovens, impedindo a concretização de sonhos e desejos originais e audaciosos. Mostra por que é tão difícil a realização amorosa plena e soberana numa sociedade regida pela imposição de normas morais que engessam a liberdade individual.
Tanto já se escreveu sobre o amor, mas ainda não nos permitimos um amor livre. Permitimos que as religiões e os mecanismos de dominação social nos definam como amar e, assim sendo, transformamos o amor que poderia nos libertar em correntes que nos amarram a pseudo situações mascaradas com nomes como “amor a Deus”, “amor ao próximo”, “amor conjugal” – reduzido a um mero contrato civil entre duas genitálias – “amor familiar” e assim por diante. Esquecemos completamente que o amor é um só e muito maior que qualquer rótulo.
Temos o péssimo hábito de achar que o amor nos obriga a algo quando, de fato, o amor é a expressão da mais plena liberdade. Somente nos tornamos aptos a amar quando assumimos nossa liberdade e respeitamos a liberdade dos que convivem conosco. Frederick Perls, conhecido também como Fritz Perls, escreveu um pequeno texto conhecido como a “Oração da Gestalt”, que diz o seguinte: “Eu faço as minhas coisas e você faz as suas. Não estou neste mundo para satisfazer as suas expectativas e você não está neste mundo para viver as minhas. Você é você, eu sou eu. E se por acaso nos encontrarmos será maravilhoso. E se não, não há nada a fazer”.
Gilberto Gil escreveu uma música que traduz muito bem essa idéia de liberdade. Foi gravada pelos Doces Bárbaros e diz o seguinte: “O seu amor, ame-o e deixe-o livre para amar. O seu amor, ame-o e deixe-o ir aonde quiser. O seu amor, ame-o e deixe-o brincar. Ame-o e deixe-o correr. Ame-o e deixe-o cansar. Ame-o e deixe-o dormir em paz. O seu amor ame-o e deixe-o ser o que ele é”.
O tema do amor é tão vasto que não cabe numa crônica. Deixo como reflexão mais um pensamento do Roberto Freire: “Para se viver um amor inteiro, livre e nem um pouco sadomasoquista, sem nenhum sacrifício, é preciso ter a coragem do ridículo, de assumir coisas aparentemente absurdas e incomuns. Porque cada um tem uma forma original e pessoal de amar, se é realmente livre. Ser livre é muito mais difícil do que alcançar o prazer sexual. A repressão sexual nas crianças e nos jovens não visa diminuir-lhes o prazer em si, mas, sobretudo, de modo indireto, o que se pretende é mesmo reduzir sua liberdade, para ser mais fácil dominá-los e conduzi-los”. Que todos tenham uma boa reflexão sobre o amor.
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