Tratava-me por “Seo Pedro”. Daquelas reverências próprias de pessoas puras e humildes, quando no trato de pessoas (que elas acham ser) “mais importantes”. Outra prova, portanto, da sua inocência.
Eduardo, o marceneiro, atentamente preparava um pedaço de madeira com a qual eu iria construir uma prateleira para livros, no quarto de meu caçula.
Foi quando observei que ele, diferentemente dos demais de sua profissão, possuía todos os dedos (completamente inteiros) em ambas as mãos. Nem uma ponta de dedo decepada ou dedo estropiado. Possuía, o bom marceneiro, um par de mãos calosas, fortes e empoeiradas. Porém, saudavelmente perfeitas.
Como meu costume é sempre tecer comentários que valorizam as peculiaridades e os conhecimentos técnicos de todo profissional com o qual tenho contato, principalmente sobre aqueles “considerados” de atividades mais simples, fiz uma observação acerca da integridade de suas mãos. Prontamente ele me responde, sem deixar de manter-se extremamente concentrado no que fazia:
- Nunca me cortei sério, “Seo” Pedro. Pequenos cortes, arranhões e pancadas não dá prá evitar. Mas, nunca perdi um dedo ou um pedaço de mão.
E, em tom mais sério e professoral, completava:
- É que tomo muito cuidado quando estou trabalhando... Vários colegas já perderam os polegares ou outros dedos. Muitos, o dedo mindinho... Mas também! Vivem dormindo....
Nada mais lhe falei. Apenas mostrei-lhe, com expressões faciais, meu espanto e admiração por sua postura profissional.
Passei boa parte daquele dia pensando, filosofando, falando comigo mesmo:
- Sábia postura profissional, meu bom marceneiro. Percorreste incontáveis teorias acerca do Consciente e do Inconsciente. Navegaste com pureza e simplicidade por estes universos, colocando à prova teorias de reconhecidos sábios como Freud, Jung, Adler, entre outros. Tivessem lhe ouvido, muitos deles teceriam profundas e intermináveis defesas de suas teses, acerca do ocorrido.
Este caso, entre a teoria e a prática, me faz lembrar a expressão “Um burro carregado de livros é doutor?”. Pois, de que valem as teorias quando não experimentadas na simplicidade do dia-a-dia?
por Pedro Lopes de Oliveira.
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